quinta-feira, junho 05, 2008

pés de sinamão (parte 2)


Era um orgulho ficar de braços na janela vendo aquela chuva cair e lá vinha a irmã quase da mesma idade incomodar um pouco, querendo seu devido espaço na janela.

...O asfalto ainda não se tinha naqueles anos, então dava pra sentir aquele cheirinho de terra molhada, agora era só ir dobrando a roupa. Tinha movimento já na padaria - mais adiante eu falo da padaria, ela tinha seus 4 anos, bem localizada ela é. Era meia tarde, hora do café, 16 horas mais ou menos, a mãe deixou pra dobrar depois, mesmo começando a chover ainda tinha gente chegando na padaria apesar de ser em número menor, mas a mãe do moleque precisava “dar uma mão”.
Era em preto e branco, mas havia uma TV naquela casa, mais ou menos nessa hora- a do café- passava o Clube do Bolinha, tinha até uma trilha: “bolinha, bolinha, está na hora de você entrar na linha”. Eu lembro de algo, você lembra? O rapaz também lembra. Passava na TV Band era um sucesso. Concorrente direto do Chacrinha, outro sucesso para a década de 80 só que esse era na Rede Globo.
Descambou-lhe água de vez agora, era até bonito de se ver aquela chuvarada, parecia que só lá naquelas terras é que a chuva derramava daquele jeito. Era um orgulho ficar de braços na janela vendo aquela chuva cair e lá vinha a irmã quase da mesma idade incomodar um pouco, querendo seu devido espaço na janela. Vez ou outra virava pra traz, olhava para a TV a fim de assistir mais um pouco do Clube do Bolinha, apesar de estar meio chuviscada a imagem no aparelho, ela não perdia o seu efeito de distração. Era algo além do que se podia imaginar, como é que aquelas pessoas foram parar ali naquela caixinha com vidro. “eu não acredito que vocês estão com essa TV ligada”- esbravejou a mãe dos pequenos- ficaram em silêncio se entre olharam o rapaz e a guria e disseram com toda certeza “ah mãe nem ta trovejando” e nisso cai aquele estrondo que ninguém nunca está esperando “viram? O que que’u disse? Mas será que eu mesmo tenho que desligar”? E lá se vai à mãe dos moleques... desliga a TV. De modo que não existia um botão, você empurrava uma espécie de roda que fazia o trabalho de regular a imagem pressionando-o e de desligar e ligar o aparelho pressionando mais ao meio, era divino! Coisas do futuro, claro.
Silencio geral, ninguém conversava, era uma tensão total quando caía aquele tipo de chuva com trovoadas, rezava-se para não se transformar em uma tormenta. Mais meia hora e a chuva estiou, não sei se em outro lugar acontece, mas lá geralmente depois de tudo isso, vinha aquele imenso arco-íris e junto tudo quanto é história, lendas e contos, desde o pote de ouro até aquela que se passasse por baixo dele se transformaria em alguma coisa. Agora era só chamar os amigos pra conversar em baixo dos sinamão e balança-los para cair água em cima de todo mundo... O guri queria construir uma casa em cima daqueles sinamão, só um sonho, nunca conseguiu, o máximo que chegou foi levar umas 3 tábuas e deixar lá em cima pra ficar deitado em ar e sombra pura. Era maravilhoso o trabalho de ter que subir lá pra cima e depois o prazer de já estar lá...

Nenhum comentário: